Na última semana, o Superior
Tribunal de Justiça condenou a Globo a pagar indenização de 50 mil reais a um
homem que supostamente teria envolvimento com a Chacina da Candelária, mas que
já havia sido absolvido, por tê-lo associado ao crime em um episódio de Linha
Direta, anos depois dos fatos. A premissa para o julgamento foi a de que teria
havido violação do “direito ao esquecimento”, em contraposição à liberdade de
imprensa.
O Direito, como se sabe, é dinâmico,
e sempre se renova e se adequa às necessidades da sociedade. No campo dos direitos
da personalidade, ou seja, aqueles direitos inerentes ao próprio ser humano, além
dos já famosos direito à privacidade, à honra, à vida etc., vêm surgindo novos
direitos que devem ser trazidos a um espaço como este, do jornal, para que sejam
mais conhecidos e mais respeitados. Eis, portanto, o direito ao esquecimento.
É normal que determinados direitos
entrem em conflito. Por exemplo, muitas vezes o direito à privacidade vai
frontalmente de encontro à liberdade de imprensa, e um dos dois prevalece a
depender de cada caso concreto – muitas vezes, vale dizer, a privacidade fica
no escanteio. Com a internet e os paparazzi, então, nem se fale. Qualquer fato
ou foto pode ser “ressuscitado” de uma hora para outra, pondo certas pessoas,
celebridades ou não, em situações desagradáveis.
Naturalmente, é preciso ter muito
cuidado com a tal liberdade de imprensa, mas isso não significa que qualquer
fato da vida de uma pessoa possa ser revisitado fora do contexto. É por isso
que, nas palavras de Stefano Rodotà, o direito ao esquecimento é aquele direito
que garante que nem todas as “pegadas” da vida de uma pessoa devam segui-la
implacavelmente até o fim de sua existência. Este direito surgiu no âmbito das
condenações criminais, e faz muito sentido que ele exista, porque é
extremamente injusto que uma pessoa seja para sempre marcada por um crime que
não cometeu ou que cometeu e cuja pena já cumpriu.
A reflexão sobre este direito ao
esquecimento é importante por dois motivos. O primeiro é que, este “novo
direito” deve ser debatido e amadurecido, a fim de que possa se desenvolver e
proteger quem deve ser protegido, nomeadamente pessoas que têm sua privacidade
invadida por conta da “boa memória” da internet, por exemplo.
O segundo e último motivo é um tanto
cômico, que é o de existir um direito ao esquecimento em um país no qual as
pessoas já são naturalmente bastante “esquecidas”. Diuturnamente políticos
“ficha-suja” retornam aos palanques e se reelegem sem maiores complicações, ou,
depois de eleitos, “esquecem” das promessas de campanha; e há ainda os
eleitores, que pagam severos impostos e, nas eleições, “esquecem” que os
tributos não foram investidos em nada.
De esquecimento o brasileiro entende
bem. Quanto ao “novo direito” ao esquecimento, espero que ele proteja aqueles
que dele precisarem, que têm sua privacidade violada e sua vida perturbada.
Quanto aos “esquecidos” acima, que eles sejam sempre lembrados!
Publicado no jornal AMAZONAS EM TEMPO em 8 de junho de 2013.