quinta-feira, 13 de junho de 2013

O tal direito ao esquecimento

Na última semana, o Superior Tribunal de Justiça condenou a Globo a pagar indenização de 50 mil reais a um homem que supostamente teria envolvimento com a Chacina da Candelária, mas que já havia sido absolvido, por tê-lo associado ao crime em um episódio de Linha Direta, anos depois dos fatos. A premissa para o julgamento foi a de que teria havido violação do “direito ao esquecimento”, em contraposição à liberdade de imprensa.

O Direito, como se sabe, é dinâmico, e sempre se renova e se adequa às necessidades da sociedade. No campo dos direitos da personalidade, ou seja, aqueles direitos inerentes ao próprio ser humano, além dos já famosos direito à privacidade, à honra, à vida etc., vêm surgindo novos direitos que devem ser trazidos a um espaço como este, do jornal, para que sejam mais conhecidos e mais respeitados. Eis, portanto, o direito ao esquecimento.

É normal que determinados direitos entrem em conflito. Por exemplo, muitas vezes o direito à privacidade vai frontalmente de encontro à liberdade de imprensa, e um dos dois prevalece a depender de cada caso concreto – muitas vezes, vale dizer, a privacidade fica no escanteio. Com a internet e os paparazzi, então, nem se fale. Qualquer fato ou foto pode ser “ressuscitado” de uma hora para outra, pondo certas pessoas, celebridades ou não, em situações desagradáveis.

Naturalmente, é preciso ter muito cuidado com a tal liberdade de imprensa, mas isso não significa que qualquer fato da vida de uma pessoa possa ser revisitado fora do contexto. É por isso que, nas palavras de Stefano Rodotà, o direito ao esquecimento é aquele direito que garante que nem todas as “pegadas” da vida de uma pessoa devam segui-la implacavelmente até o fim de sua existência. Este direito surgiu no âmbito das condenações criminais, e faz muito sentido que ele exista, porque é extremamente injusto que uma pessoa seja para sempre marcada por um crime que não cometeu ou que cometeu e cuja pena já cumpriu.

A reflexão sobre este direito ao esquecimento é importante por dois motivos. O primeiro é que, este “novo direito” deve ser debatido e amadurecido, a fim de que possa se desenvolver e proteger quem deve ser protegido, nomeadamente pessoas que têm sua privacidade invadida por conta da “boa memória” da internet, por exemplo.

O segundo e último motivo é um tanto cômico, que é o de existir um direito ao esquecimento em um país no qual as pessoas já são naturalmente bastante “esquecidas”. Diuturnamente políticos “ficha-suja” retornam aos palanques e se reelegem sem maiores complicações, ou, depois de eleitos, “esquecem” das promessas de campanha; e há ainda os eleitores, que pagam severos impostos e, nas eleições, “esquecem” que os tributos não foram investidos em nada.


De esquecimento o brasileiro entende bem. Quanto ao “novo direito” ao esquecimento, espero que ele proteja aqueles que dele precisarem, que têm sua privacidade violada e sua vida perturbada. Quanto aos “esquecidos” acima, que eles sejam sempre lembrados!



Publicado no jornal AMAZONAS EM TEMPO em 8 de junho de 2013.

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