sexta-feira, 15 de março de 2013

Entre a mídia e a Justiça


Há algum tempo que o Supremo Tribunal Federal transmite as sessões dos julgamentos pela TV Justiça, ao vivo, para todo o país. Por este canal, o povo brasileiro já teve a oportunidade de acompanhar a declaração de constitucionalidade da união estável de casais homoafetivos, a permissão de aborto dos fetos anencefálicos, a legalidade da “Marcha da Maconha”, o julgamento do mensalão e muitas outras questões polêmicas que passaram pela Corte Constitucional.

Nos últimos dias, a Justiça brasileira nos presenteou – ou presenteou a imprensa, pelo menos – com a primeira transmissão ao vivo de um julgamento do tribunal do júri, no “caso Mizael”, do ex-policial militar acusado de matar a ex-namorada, Mércia Nakashima, não só pela televisão, como também via internet. Ao autorizar a transmissão, o juiz-presidente do Tribunal do Júri teria dito aos jornalistas: "a única coisa que eu não quero nesse julgamento é o sensacionalismo. Espero que a confiança que depositei nos senhores seja recíproca”.

A iniciativa é salutar, ousada e pretende aproximar o Poder Judiciário da sociedade civil, “público-alvo” da atividade jurisdicional enquanto serviço público. Desta forma, o cidadão tem mais acesso às coisas da lei, se assim desejar. Entretanto, muito embora a medida seja admirável, não deixa de ter consequências negativas, principalmente quanto às atuações dos juristas sob os olhos das câmeras.

O problema está justamente na “hollywoodização” da Justiça, quando juízes, promotores e advogados acham mais importante o destaque diante da mídia nacional, garantindo mais prestígio e clientes (no caso dos advogados), do que a defesa das teses jurídicas que propõem. Neste “caso Mizael”, infelizmente já fomos “brindados” com a lamentável afirmação do promotor de Justiça para o advogado de defesa: “o diabo é o pai da mentira. O senhor é amigo do diabo!”. Ora, tudo bem que os ânimos se exaltam no tribunal do júri, mas isso não pode dar azo ao pavonismo televisionado.

O próprio Supremo Tribunal Federal – a mais alta Corte do país – muitas vezes sofre dos sintomas desta síndrome, sobretudo na prolixidade dos votos. É verdade que um voto deva ser bem fundamentado, mas certos ministros, mesmo com o julgamento já decidido pela quantidade de votos, fazem questão de ler suas decisões, com longas citações em alemão ou italiano, e passam a impressão de fazê-lo por pura vaidade.

De todo modo, a ampliação da publicidade dada aos julgamentos, pela transmissão via televisão e internet, representa um grande progresso, porque dá à sociedade uma via de acesso mais técnico às questões de direito, livre de olhares míopes; caso o Poder Judiciário não faça este movimento de aproximação, deixará a sociedade à mercê da mídia, que nem sempre é imparcial, honesta e de boa índole. E quanto às repercussões negativas? Bom, não há nada a fazer: apenas esperar que passe o “frisson” dos 15 minutos de fama que acomete uns e outros e, se tudo der certo, em breve voltaremos à “programação normal”.



Publicado no jornal AMAZONAS EM TEMPO em 16 de março de 2013.

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