Há cerca duas semanas, as redes de
televisão e jornal transmitiram, diretamente do Kentucky (EUA), a notícia de
que um menino de 5 anos havia disparado um tiro de rifle contra sua irmã de 2
anos, que faleceu imediatamente. A arma, que já era do menino e havia sido dado
a ele por seus pais, fazia parte de uma linha de rifles fabricada especialmente
para crianças, chamada “Meu Primeiro Rifle”; segundo o legista da cidade, o
episódio foi um destes “acidentes loucos”.
A notícia acima, veiculada nas
maiores agências de comunicação do mundo, possui vários traços de anormalidade.
O primeiro, obviamente, é o fato de uma criança de 5 anos, independentemente
das circunstâncias, ter ceifado a vida de sua irmã de 2 anos. Depois, o fato de
tê-lo feito (i) com uma espingarda, (ii) que lhe fora presenteada por seus
pais, (iii) de fabricação específica para crianças, (iv) e que resultou numa
fatalidade banalmente considerada como “acidental” pelos familiares e amigos da
vítima e seu irmão.
Neste caso, volta à baila a
discussão sobre o desarmamento, e se é pertinente ou não que a sociedade civil
tenha acesso a diversos tipos de armas. Francamente, até que há argumentos
plausíveis tanto para aqueles que defendem o desarmamento, quanto para aqueles
que defendem uma sociedade armada até os dentes. No entanto, a que ponto
podemos chegar quando a ofensividade de uma arma de fogo é simplesmente
esquecida? Rifles para crianças? Parece brincadeira.
Defender que uma sociedade possa se
armar, caso queira, é até aceitável; contudo, esta opinião não pode se escusar
do manto da razoabilidade. É razoável que os pais deem para um filho de 5 anos
um rifle carregado e em pleno funcionamento? É razoável que uma empresa, em um
país minimamente sério, fabrique rifles destinados ao público infantil sem que isso
lhe cause maiores problemas? É razoável que este episódio seja encarado como um
destes “acidentes loucos”, em que o resultado vence o improvável? Não, não é;
seria até previsível que algo fosse dar errado.
A morte da pequena Caroline Starks,
de 2 anos, não foi um mero “acidente louco”, mas um desastre causado pela
leviandade no trato com a vida. É evidente que, ao entregar uma quantidade
enorme de armas nas mãos de pessoas despreparadas, esse tipo de “acidente”
aconteça; e então ele deixa de ser acidente e passa a ser pura e simples
irresponsabilidade.
Coitado de seu irmão, de 5 anos, que
certamente ainda não entendia – pelo menos não até ter matado a própria irmã –
toda a potencialidade lesiva daquela arma colorida (pois que fique bem claro: a
linha de rifles fabricada para crianças é até mesmo colorida!). Coitados dos
pais que, achando normal dar um rifle de presente ao filho menor impúbere,
perderam a filha. Coitada da sociedade americana, que mais uma vez teve de
passar por um destes “acidentes loucos”, e que poderia ter sido evitado. Que
este triste episódio sirva de reflexão, para que aprendam de uma vez: arma não
é brinquedo.
Publicado no jornal AMAZONAS EM TEMPO em 11 de maio de 2013.
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