No mercado editorial, há uma série de
livros de coisas para se fazer antes de morrer. Há os “mil lugares para
conhecer antes de morrer”, os “mil filmes para assistir antes de morrer”, os
“mil discos para escutar antes de morrer”, os “mil vinhos”, “mil quadros”, e
por aí vai, para todos os gostos e hobbies. Infelizmente, dificilmente teremos
tempo ou dinheiro para ver, provar, escutar ou assistir estas milhares de
coisas.
No entanto, se há um “milhar” que
nós podemos conhecer de graça, além dos filmes e músicas ilegalmente baixados
da internet, é um milhar de pessoas. Cada um deveria ter sua própria listinha
de “mil pessoas para conhecer antes de morrer”, sem que nela estivessem
listados nomes, mas apenas características. Todos, antes de morrer, deveriam
conhecer um grande amor, um artista de circo, um sonhador, uma chef de cozinha
ou um turista aventureiro. Ora, que melhor jeito de conhecer o mundo do que
conhecer as pessoas do mundo?
Certa vez, em razão de participar de
uma espécie de programa de intercâmbios, recebi um pedido de um rapaz do Rio de
Janeiro para que eu hospedasse quatro amigas suas que estavam em Manaus e não
tinham para onde ir. Não pude hospedá-las em minha casa, mas, diante da imagem
de quatro moças indefesas perdidas pela cidade, liguei para um amigo meu e
sugeri que as hospedasse, em nome da caridade e de uma experiência nova –
hospedar desconhecidas! – que seria, pelo menos, educativa. Pois bem, ele
aceitou.
Eis que, no dia seguinte, depois das
tratativas iniciais, as quatro mulheres chegaram à casa de meu amigo. Duas ex-estudantes
de antropologia da Espanha, que tinham resolvido viajar pelo mundo, no melhor
estilo “turista aventureiro” na busca pelos “mil lugares para conhecer antes de
morrer”; uma da Noruega, de quem não se soube muito; e uma de Volta Redonda,
formada em Psicologia pela UERJ, mas que também tinha resolvido sair viajando
pelo mundo.
As moças ficaram em Manaus por três
dias, período durante o qual ouvi as lamúrias de meu amigo, a me contar o
tamanho da enrascada em que eu o pusera: pelo que dizia, as moças haviam
trazido consigo um cheiro fortíssimo, agravado pelo fato de não tomarem banho um
dia sequer desde sua chegada, muito embora todas as facilidades higiênicas
tivessem sido oferecidas. “Muy amigo, Paulo!”, ele dizia.
Depois que as moças foram embora,
sabe-se lá para onde, visitei este meu amigo e pude constatar que suas
lamentações eram verdadeiras: ele havia investido boa quantia em dinheiro em
incensos e aromatizantes de ambientes para tentar livrar seu apartamento do
“espectro” de cachorro-molhado deixado pelas meninas e que empestava quarto,
sala e cozinha.
A lista das “mil pessoas para
conhecer antes de morrer” de meu amigo já teve seu início, e dela já se pode
riscar os “turistas aventureiros”, partindo, enfim, para que conheça um grande
amor, um artista de circo, um sonhador etc. Tudo isso, é claro, não sem uma
grande lição: as próximas 999 pessoas devem, indispensavelmente, gostar de
tomar banho!
Publicado no jornal AMAZONAS EM TEMPO em 4 de maio de 2013.
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