Sempre que surge um momento de
silêncio entre mim e a Ana, ela me diz: 25 centavos. Da primeira vez que ouvi a
frase, não soube o que ela queria dizer com aquilo, e perguntei logo do que se
tratava. “25 centavos pelo seu pensamento”, ela respondeu. Queria saber,
portanto, o que passava pela minha cabeça enquanto transcorriam aqueles
segundos que atravessavam a conversa entre uma palavra e outra.
Jamais soube o que dizer em todas as
vezes que passávamos por esses momentos e ela me dizia, curiosa: 25 centavos.
Sempre respondia que não estava pensando em nada, mas, sinceramente, não sei se
era verdade. Incomoda-me profundamente a ideia de que, por alguns instantes, o
cérebro possa entrar em inatividade, e alguém possa dizer que realmente não
estivesse pensando em nada; por outro lado, toda vez que ela me oferecia 25
centavos pelo meu pensamento, eu não conseguia, apesar do esforço, formular
qualquer resposta sobre o que eu estivesse eventualmente pensando. E agora?
Segundo um amigo a quem contei a
história, provavelmente pensamos milhares de coisas ao mesmo tempo nesses
breves minutos, e por isso não conseguimos concatenar em palavras o que passou
pela mente. Parece uma boa resposta, mas não posso deixar de pensar que,
igualmente, pode ser que, diante da inquisição (“25 centavos pelo seu
pensamento!”), simplesmente não consigamos revelar para o outro as nossas
ideias porque o pensamento é a última fronteira da intimidade.
Não é que necessariamente tenhamos
vergonha de revelar os nossos pensamentos por serem eles escusos ou socialmente
reprováveis; isso também, claro. No entanto, temos receio de dizer o que
estamos pensando porque expor as ideias assim, diante da imposição de uma
pergunta, é enfrentar a pior nudez que existe: não a de estar sem roupas, mas a
de estar sem subterfúgios que protejam o que nós realmente pensamos de tudo e
de todos.
Na era da informática, com o Twitter
e o Facebook permeando todas as horas de nossas vidas, é cada vez mais difícil
guardar para si um fragmento de verdadeira privacidade e intimidade. A
privacidade, a propósito, diz respeito à nossa vida em um círculo social
pequeno, com amigos e família, e isso, infelizmente, já está completamente
publicado em aleatórias páginas da internet. A intimidade, por sua vez, possui
um núcleo mais restrito, que se refere ao indivíduo consigo e suas relações
interpessoais mais caras: esta dimensão já está ameaçada pelas suspeitas de
fraudes de e-mails, espionagem, manipulação ilegal de dados etc.
O que nos resta, então, senão nosso
pensamento? Ele é, realmente, a última fronteira que nos separa da absoluta
exposição, não obstante isso soe exagerado. George Orwell anteviu, na obra
“1984”, o terror que seria viver em um mundo no qual pensar certas coisas seria
crime, e talvez o receio em desnudar o próprio pensamento seja natural àqueles
que leram o livro... De todo modo, continuarei a responder que “não sei”,
sempre que Ana me perguntar o que estou pensando: é a defesa dessa última
fronteira.
Publicado no jornal AMAZONAS EM TEMPO em 23 de novembro de 2013.
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