Desde o anúncio da substituição do
vestibular convencional pelo Exame Nacional do Ensino Médio como avaliação para
o ingresso em universidades federais, a comunidade acadêmica tem feito diversas
especulações sobre o conteúdo da prova e sobre como seria a nova abordagem das
questões contextualizadas.
Como é de conhecimento geral, às
vésperas de sua realização, o exame foi furtado, e, a partir daí,
desencadeou-se um processo de efeitos colaterais desastrosos. O primeiro
aspecto grotesco deste episódio começa pelo furto da prova: o que pretendiam os
criminosos ao tentar vender a prova para um jornal? Sabe-se lá. O fato é que
foi causado um prejuízo de 35 milhões de reais aos cofres públicos – conta que
nós, pobres contribuintes, pagaremos.
Os danos originados do vazamento do
Enem vão além do foro financeiro: e os vestibulares por todo o país que tiveram
de remarcar suas provas? E as escolas que adiantaram todo o seu conteúdo
programático para finalizá-lo antes do exame? Soma-se a isso um sentimento de
vergonha, porque a culpa de tudo isso é da administração pública, que
fiscalizou com tanto descaso a impressão de um documento desta relevância.
Contudo, o vazamento da prova trouxe
um ponto positivo: todos nós podemos saber quais são os moldes em que o novo
exame deverá vir e que “questões substanciais” ele deverá abranger, dentro do
conceito tão falado das questões contextualizadas.
Infelizmente, o ponto positivo acaba
aí, pois seguido à leitura da prova, vem um enorme sentimento de desespero. Então
o ingresso em universidades de renome será embasado em questões assim? Toda a
expectativa ao redor do novo vestibular ruiu, pois é inacreditável que o MEC
queira trocar provas confiáveis por este instrumento de qualidade tão diminuída.
A nova prova deve ser reconsiderada.
Não seria necessário, para obter uma boa pontuação, ter concluído o ensino
médio. Para ter ido bem no Enem, seria necessário apenas ser alfabetizado e ter
o mínimo de bom senso – e isso, como critério de admissão no ensino superior, é
inadmissível.
Pode-se falar o mesmo da proposta de
redação, que é vaga e mal fundamentada, visto que os textos de apoio são pobres
de informação e de motivação ao candidato que pleitear uma vaga no “sistema
unificado de ensino”. Além do mais, a prova parece testar a resistência física
do candidato, pois é cansativa e possui muitos textos demasiadamente longos,
tornando-se anti-funcional.
Avaliar-se-á a competência de um
aluno para ascender à universidade de maneira tão rasa? A aplicação de um teste
nacional que não atesta absolutamente nada sobre conhecimentos gerais será a
sentença final de que o ensino no Brasil está fadado ao fracasso, e isso não se
pode permitir.
A prova realmente traz temas que
devem ser abordados. No entanto, são abordados de maneira absolutamente fraca. Desmatamento,
tabagismo, educação, idade avançada, cultura brasileira... A despeito dos
temas, a amplitude do exame não deveria permitir a elaboração de questões
beirando o ridículo. Se forem questões sobre as quais se pode discursar
independente do grau de instrução, aonde foi a meritocracia que rege o ingresso
numa instituição federal?
Não posso criticar construtivamente
as questões de ciências exatas, por não ser minha seara, mas posso dizer que
não eram as mais difíceis. Quanto às questões de ciências humanas, comentários
acerca de sua carência de conteúdo são dispensáveis. Convido todos a fazerem o
download da prova no site do Inep e a se deliciarem com a nova educação brasileira.
Publicado no jornal AMAZONAS EM TEMPO em 18 de outubro de 2009
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