sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Greve, Europa e mobilidade acadêmica internacional.


Desde o começo de 2012 se fala em greve geral dos professores nas universidades federais; o boato tornou-se realidade com a deflagração de um movimento grevista aderido por mais de 50 universidades.

A greve do servidor público é, em princípio, um meio legítimo de reivindicar direitos; e quanto a sua eficácia? O professor merece salário, respeito e condições de trabalho condizentes com a função social do magistério, além de outras demandas justas feitas pela classe, mas por quantas greves teremos que passar até lá?

Não entremos, contudo, no mérito da greve em si, que divide opiniões – e que bom que divide, pois da unanimidade devemos sempre desconfiar. O movimento, independente do rumo que tome, deve nos levar a uma reflexão sobre a nossa situação atual.

Pude vir, pela UFAM, para um semestre na Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Portugal. Além do proveito acadêmico, a experiência se fez valiosa pelo contato com um bloco em crise e sua visão acerca de onde venho. Brasil? Queremos ir para lá! Ouvi isso de toda a gente. E por que querem ir? Não é pelas praias, mas porque no Brasil há empregos.

Vi casos interessantes: em Barcelona, uma barista prestes a terminar o mestrado em Psicologia, sem perspectiva de sair do bar e exercer a profissão; em Praga, formandos com planos de ir ao Brasil trabalhar; em Munique, uma garçonete terminando o curso de Letras, sem saber o que fazer depois.

O professor universitário brasileiro é um gênero específico: tem que falar português (fluentemente, de preferência), entender as nuances sociais do país e passar ao aluno um ponto de vista crítico. São muitas exigências, e é por isso que o ensino superior no Brasil ainda não recebeu tantos estrangeiros quanto outras profissões.

Enquanto aqui há gente qualificada sem ter onde exercer seu diploma, no Brasil há vagas de professores vazias e professores sem motivação para buscar qualificação profissional. Quem quer ser professor sem ser reconhecido?

É preciso ter cuidado com essas comparações. Na maioria das universidades públicas da Europa, o ensino é pago. Cerca de mil euros por ano, por aluno: o dinheiro é aplicado no desenvolvimento da universidade e a própria atividade acadêmica gera renda e autossuficiência.

Então devemos refletir: é correto, por exemplo, uma Faculdade de Direito como a Jaqueira não possuir nem um curso de mestrado? Uma universidade como a UFAM ter salas em condições tão ruins? Bibliotecas desatualizadas? Falta de energia?

Ao comparar, pode-se ter a ilusão de que a Europa é o sonho de todo acadêmico. Bom, não é. Existem problemas lá e cá, mas o problema “professor mal pago” já foi deixado para trás na maioria dos países do ocidente europeu.

O que a Europa já aprendeu e o Brasil insiste em não imitar é que investimento em educação faz parte do crescimento econômico. Se pretendemos trilhar o caminho de uma potência mundial, trilharemos mancos enquanto não investirmos em ensino de qualidade.



Publicado no jornal AMAZONAS EM TEMPO em 25 de junho de 2012.

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