sexta-feira, 5 de outubro de 2012

O estupro da informação


A internet mudou a dinâmica de muitas coisas em pouco mais de 20 anos: o modo como namoramos, procuramos empregos, nos expressamos; mudou também a dinâmica de como se movimenta informação. O dicionário, que antes era o “pai dos burros”, perdeu a posição para o Google; a televisão teve que encarar o YouTube; o boca-a-boca agora é pelo Twitter e por aí vai.

Em meio a isso tudo, surge o Facebook (com seu botão compartilhar), para alterar ainda mais o jeito pelo qual milhares de pessoas manifestam uma indignação em comum, uma paixão, um hábito, uma frase. Além disso, a rede social mais popular do momento tornou-se a “espada” de revolucionários virtuais contra a corrupção, a falta de investimentos em saúde e educação, a pobreza e as injustiças da sociedade: lutar contra tudo isso está a um clique de distância.

Mas será que basta compartilhar uma imagem ou um texto no Facebook para cumprir o papel de cidadão ativo? Será que disseminar pensamentos revoltosos contra a corrupção já é combatê-la? Apesar da duvidosa eficácia do trabalho dos militantes virtuais, duas coisas boas surgem dessa história: as pessoas agora possuem mais informação e também tecem mais opiniões sobre as coisas que acontecem ao seu redor.

É importante ter uma opinião, ainda que tímida, delirante ou até mesmo comprovadamente errada. Quanto à informação, é uma questão de quantidade ou qualidade? De fato, cresceu o acesso à informação graças a essas novas mídias e redes sociais, mas muitas vezes é a informação errada, a desinformação.

Estamos diante de um grande perigo, qual seja o de as pessoas estarem se revoltando e se insurgindo sem nem saber por que ou pelo que, ou com base em enganos, falácias ou mentiras.

A partir daí, como a metástase de um câncer, começam a se espalhar correntes com informações absurdas ou dados falsos. Quem se lembra da “polêmica” com as palmeiras do condomínio Ephigênio Salles? Compartilhamento inocente de alguém que simplesmente não sabia que ali ocorria uma ação ecológica autorizada pela Prefeitura. Os exemplos são inúmeros: comparações teratológicas, estatísticas sem referências, informações falsas sobre a Lei da Ficha Limpa, o auxílio-reclusão, bolsa-família, salários de funcionários públicos, votos nulos e eleições, citações atribuídas a autores que jamais falaram nada daquilo e muito mais, espalhando-se pela rede como verdades incontestáveis.

O que ocorre é o verdadeiro estupro da informação e de tudo o que ela significa. Na era do “Pai Google”, a notícia que vem é suficiente, e quase ninguém se dá ao trabalho de verificar fontes e fatos, ocupando-se apenas de passar mentiras adiante como se isso esgotasse as possibilidades de agir, como se fosse expressão máxima da guerra contra tudo que existe de ruim e errado na vida.

Nós precisamos entender que o mundo não precisa de Che Guevaras virtuais, mas de mais pessoas razoáveis, críticas, curiosas e bem-informadas dentro e fora do Facebook.



Publicado no jornal AMAZONAS EM TEMPO em 14 de setembro de 2012.

Nenhum comentário:

Postar um comentário