Em outubro de 1988, há
cerca de 25 anos, Ulysses Guimarães, então Presidente da Assembleia
Constituinte, erguia perante o Congresso Nacional e o povo a nova Constituição
da República Federativa do Brasil, carinhosamente apelidada de Constituição
Cidadã. Hoje, apesar das inúmeras crises pelas quais o país passa – cite-se,
por exemplo, uma severa crise política e de legitimidade –, ainda há motivos
para comemorar este jubileu de prata.
A nossa Constituição sempre
deixa os nervos à flor da pele, até mesmo quando se comemora seu aniversário:
nesta última semana, a Câmara dos Deputados outorgou mais de mil medalhas
comemorativas para aqueles que foram personagens decisivos do processo de
redemocratização e constitucionalização do Brasil. Entre os agraciados, José
Genoíno, deputado federal condenado pelo Supremo Tribunal Federal por corrupção
ativa e formação de quadrilha. Não sei exatamente por qual motivo, mas me
parece que o aniversário da Constituição não poderia passar sem que houvesse uma
incongruência dessas.
Mesmo assim, devemos fazer
desta data (que na verdade foi semana passada, em dia 5 de outubro) um momento
de felicitação. De 1988 até aqui, a Constituição passou por várias mudanças e
sofreu críticas; no entanto, é inegável que a Carta Cidadã foi um documento
essencial para os avanços que o país vivenciou nos últimos anos.
Apenas por exercício
argumentativo, dou um exemplo: o Brasil constitucionalizou um sistema de saúde
totalmente gratuito, integral e acessível a todas as pessoas (art. 196),
nacionais ou estrangeiros. É verdade que a saúde pública não funciona
perfeitamente, mas apenas esta opção do legislador constituinte já significa
uma grande vantagem para a população, que muitas vezes, mesmo através do
Judiciário, obtém a cura de suas moléstias, graças à Constituição.
Certa vez, em tom de
chiste, o Ministro Luís Roberto Barroso disse que a Constituição de 1988 tinha
uma solução para tudo: só não trazia a pessoa amada em três dias. Uma verdade
disfarçada de gracejo: nossa Lei Fundamental tratou de muitos assuntos que não
precisariam ser tratados por ela, até mesmo constitucionalizando o Colégio
Pedro II, no Rio de Janeiro (art. 242, §2º). Seria este um defeito?
Particularmente, reluto em apontar “defeitos” na Constituição: penso que ela
possui muitas vicissitudes e peculiaridades, que fazem dela um documento único.
Dizem também que a
Constituição é uma colcha de retalhos, emendada até seu último fio de cabelo.
Não posso discordar do fato de que a nossa Carta Política fora “remendada”
inúmeras vezes nestes últimos 25 anos; contudo, não é de se concluir que isto
seja algo necessariamente ruim. Penso que faz parte do que é a essência da
Constituição, dado ser uma Constituição à brasileira: retalhada, colorida,
carioca; uma Constituição bossa-nova, uma Constituição feijão-com-arroz, e por
aí vai. Que ela – que, afinal, tem a nossa cara – tenha um feliz aniversário,
com mais respeito ao seu texto e mais efetividade às suas normas. Parabéns!
Publicado no jornal AMAZONAS EM TEMPO em 12 de outubro de 2013.
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